26/07/2020 18h17
Histórias e fotos – capítulo X
A compra da casa Na liquidação da loja ao final de 1972, não sobrou nada. O carro, a casa que compramos em 36 parcelas e faltava um ano para terminar o pagamento. Foi tudo pelo ralo. A doença do marido nos tirou tudo. Só não levou a minha determinação de não depender de ninguém e ser sujeito da minha própria história. Perto do apartamento que alugamos após nos desfazermos da casa, iam construir um conjunto residencial para os trabalhadores sindicalizados. Trabalhando no SESC, eu poderia me inscrever. Após a inscrição aprovada, pagava-se a entrada em 24 meses, durante a construção. Depois haveria o sorteio de localização do imóvel e ajuste das mensalidades. As moradias variavam de tamanho: um quarto, dois quartos pequenos dois quartos maiores e três quartos. Com a minha renda, consegui me inscrever na de dois quartos maiores. No início de 1974, as coisas não ficaram mais fáceis, mas, consegui um pouco de equilíbrio. Com horários normais de trabalho, as aulas da faculdade eram todas assistidas. Mas, os rendimentos eram poucos. Os mesmos do ano anterior. A matrícula do primário substituiu a do SESC e as aulas das quintas séries o da Educação Integrada. No MOBRAL recebíamos meio salário mínimo. Na Educação Integrada, que comecei a dois de agosto, um salário. Eu precisava fazer malabarismo para suprir as necessidades primordiais: moradia, alimentação e remédios. Felizmente naquela época, o INPS funcionava. Todo o tratamento do meu marido foi feito no Hospital Santa Isabel, em Blumenau, com os melhores especialistas. Finalmente, os imóveis estavam quase prontos e a construtora mandou uma carta marcando o dia do sorteio. Assim, se alguém quisesse fazer alguma modificação, aproveitaria a fase de acabamentos. A que nos coube ficava numa pequena elevação e tinha um enorme pé de abacate. Sanados todos os problemas. Recebemos a casa e mudamos. Era bem menor do que a da Rua Almirante Barroso, mas, havia possibilidades de futuros aumentos. Levei um susto quando recebi o carnê de pagamentos. As prestações mensais quase dobraram o valor das parcelas da entrada. Eu precisava dar um jeito de ganhar mais um pouco. Só que já estava com todos os horários, dos três turnos completos. Perdi algumas noites de sono e resolvi que iria a São Paulo comprar roupas para revender. Comuniquei nas escolas que iria a São Paulo na sexta e voltaria no domingo. Todos os professores queriam novidades. Recebi uma lista de encomendas. Fui à rodoviária tomar informações das passagens. Tinha um ônibus que saía de Itajaí As dezenove horas e chegava a São Paulo às sete da manhã. Se eu comprasse a passagem de ida e volta teria um desconto. Comprei a volta para as dezenove horas de sábado. Era uma experiência. Se eu usasse o dinheiro do primário para fazer as compras, poderia repô-lo em uma semana. Ao entregar a encomenda receberia 50% e o resto, no pagamento seguinte, quando eu viajasse outra vez. Viajei dormi a noite toda no ônibus. Ao chegar à rodoviária, fui ao banheiro, escoveis os dentes, arrumei o cabelo e a maquiagem. Tomei café dentro da rodoviária e me informei se havia guarda-bagagem. Fui até lá falei com a funcionária, peguei chave e deixei a mala vazia. Anotei o itinerário na agenda e saí. Para chegar à 25 de Março, andava-se um pouco pela Rua Santa Ifigênia e chegava. Andei de ponta a ponta, olhando as lojas e preços. Na volta comprei o que pude e voltei à rodoviária. Deixei as compras guardadas e fui almoçar, dentro da rodoviária. Sentei em uma mesa mais reservada e conferi minha relação. Ainda faltava metade das encomendas. Voltei e comprei quase tudo que faltava e levei para a rodoviária. Agora faltava pouco. Sentei no restaurante, tomei um café e voltei às compras. Às dezessete horas estava tudo pronto. Arrumei na mala e fiquei aguardando o ônibus, às dezenove horas. Cheguei a Itajaí de volta às sete da manhã. Peguei um táxi. Às sete e quinze estava em casa. Ainda encontrei o pessoal dormindo. O marido, de cara amarrada, achava uma temeridade arriscar o dinheiro do mês! Não dei muita importância, pois isso não mudaria em nada a minha decisão. Tomamos um café gostoso com o pão quentinho comprado na padaria da rodoviária. Os três estavam curiosos para ver as compras. Todos ganharam presentes. Ao examinar a mercadoria, ele aprovou e disse que eu tivera bom gosto na escolha. Sendo a maioria encomendas, eu estava confiante. O almoço vinha pronto do restaurante. Foi uma atitude que tomei para que a alimentação não faltasse à hora certa. Pois, às vezes eu me atrasava na hora do almoço. Havia um restaurante perto do conjunto. Um dia, resolvi perguntar se poderiam me vender comida em marmita, para quatro pessoas, incluindo a sobremesa? Ele me olhou sério! Expliquei que não tinha tempo para cozinhar e nem como pagar uma empregada. Depois de saber o que fazia do meu tempo, ele disse que iria tentar me atender. Pediu que eu comprasse um jogo de marmitas grandes com seis vasilhas. Só depois ele poderia calcular o valor. Fui ao supermercado, fiz a compra e deixei no restaurante. Eles entregaram ao meio dia. Nossa! Comida boa e farta. Uma marmita era para a sobremesa. Aprovada por todos, passei no restaurante para combinar. Eu resolvi pagar o mês adiantado para garantir que nunca faltasse, à hora certa. O dono sugeriu que eu pagasse 15 dias, para experimentar. Assim fizemos. Foi um sucesso! Comida e sobremesa variadas e saborosas. Para evitar qualquer mal entendido na hora da entrega, se não tivesse ninguém em casa, comprei outro jogo de marmitas. Combinamos um lugar para o entregador deixar a comida e levar a outra marmita vazia. Então, fiz questão de pagar o mês inteiro adiantado. Voltando às encomendar compradas em São Paulo, após o almoço, separei em sacos plásticos, comprados com tal finalidade e coloquei em uma bolsa. Pronta para a entrega do primário e outra com as encomendas do ginásio. Na hora do recreio, entreguei e recebi o dinheiro. A maioria preferiu dar um cheque com o restante do pagamento. Outros pagaram à vista. Ao final da tarde, voltei para casa com o dinheiro do primário recuperado e cheques que me garantiam viajar ao final do mês, já sem mexer em nada. A partir do mês seguinte, com o lucro das vendas eu pagava a prestação da casa. Esta foto é da carteira de estudante do terceiro ano do curso de Letras. Publicado por Benedita Azevedo em 26/07/2020 às 18h17
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